Não sou só
Traço meu corpo como morto no seriado da tevê a cabo.
Saio dele, olho de cima.
Ali não me vejo mais.
Vejo linha, contínua e infinita em seu contorno.
Vejo também limite.
Divisão entre o que é eu e o que é o mundo -
tudo que está fora.
Divisão que rima com ilusão.
Sou da mesma matéria do mundo.
Sou de átomos, partículas mínimas, invisíveis, penetráveis.
Sou 70% água, mas também 70% fogo, terra e ar.
Detalhes matemáticos não me incomodam.
Sou completa na minha incompletude,
do tamanho do universo,
onde tudo cabe.
Sem fim, não tem começo nem meio.
Nem espaço nem tempo.
Com a frustração no olhar do espelho
aperto forte a carne que sei que não é só.
Não sou só isso.
Essa matéria que carrego.
Não sou só.
O mundo carrego em mim.